domingo, 25 de abril de 2010

Republicanismo e República V

A (des)governação de Franco e a Oposição Republicana

Em Maio de 1906, foi constituído o gabinete ministerial presidido por João Franco, fruto do conchavo entre o Partido Progressista e o Partido Regenerador-Liberal, com o apadrinhamento pelo monarca, D. Carlos. Logo o novel Presidente do Conselho de Ministros fez declarações públicas, afirmando-se liberal e disposto a governar à inglesa, querendo com isso dizer que respeitaria o Parlamento e as suas decisões. Ao mesmo tempo, mostrava-se contrito por, conjuntamente com Hintze Ribeiro, ter governado em ditadura entre 1893 e 1897. Na verdade e, pelo menos, de início, João Franco conseguiu transmitir de si próprio a imagem do político combativo e honesto, um novo “messias” (mais um nos nevoentos horizontes portugueses), capaz de levar a efeito redentoras reformas e assim resgatar o regime monárquico da desgraça e da desonra a que havia chegado. No entanto, o controverso João Franco permanecia igual a si próprio, notavelmente ao afirmar que, em termos eleitorais pretendia «caçar no mesmo terreno dos republicanos» e que o ministério governaria com «main douce et ferme» para, pouco depois, na inauguração duma sede do seu partido em Alcântara, face às vaias que da rua lhe eram endereçadas por operários e outros populares, dizer: «os republicanos estão precisando de sabre da polícia como de pão para a boca».

Não revogou Franco a contestada «ignóbil porcaria», antes se serviu dela e, nas eleições realizadas a 19 de Agosto desse ano de 1906, a Concentração Liberal, sua base de apoio, obteve confortável maioria. Foram então eleitos pelo círculo de Lisboa, quatro republicanos: Afonso Costa, António José de Almeida, Alexandre Braga e João de Meneses. A abertura das cortes foi convocada para 29 de Setembro. O governo de João Franco, não obstante os apoios de que dispunha, não teve a acção facilitada. Dentro da arena parlamentar, as oposições, em especial os aguerridos republicanos, criaram impasses à obstrução à actividade legislativa, levando a discussão a centrar-se em torno de questões de forma ou de substância

por si levantadas ou aproveitadas. Fora do Parlamento, nos mentideros da política, nos jornais e em comícios, a opinião pública incendiava-se contra o governo e contra o regime. Duas grandes questões – Questão dos Adiantamentos e Questão Académica – pela emoção e impacto que causaram nos meios políticos, pela discussão rubra que geraram, pelas dificuldades governativas que originaram e pelo efeito negativo que tiveram na coesão ministerial e nos apoios progressistas ao governo, levaram a que Franco se decidisse pelo encerramento das Câmaras, em Abril de 1907. Pretendia com isso criar um compasso de espera que lhe permitisse, de acordo com intenções suas, e somente suas, reforçar o seu gabinete ministerial com mais elementos da hoste progressista.

Sem dúvida que esta actuação de João Franco era politicamente perspicaz, uma vez que visava, não só criar condições de governabilidade, como ainda estabelecer um elo mais apertado com o Partido Progressista. Daí poderia, quiçá, resultar uma fusão dos dois partidos (o progressista e o regenerador liberal) e, dessa forma, tornar-se ele, Franco, chefe de um grande partido como sempre fora sua ambição. Só que, os progressistas e nomeadamente José Luciano sentiram esse perigo e, naturalmente, colocaram-se em defesa. Nessa atitude, os notáveis do Partido Progressista, convidados ou requeridos por Franco para fazerem parte do seu executivo – Conde de Penha Garcia, António Cabral e Moreira Júnior – recusaram definitivamente tal “honra”, nada os demovendo dessa decisão, nem mesmo os bons ofícios de D. Carlos, feitos chegar através da estreita amizade que o unia a José Luciano.

Para ser coerente com declarações e promessas tão recentemente por si feitas, João Franco deveria agora renunciar ao cargo de primeiro-ministro. Todavia, sob instigação do soberano, não o fez e, com o seu patrocínio, entrou a governar em ditadura após a dissolução das Câmaras por decreto de 10 de Maio de 1907. E com isso, prosseguiriam as incongruências de um “messias” português, chamado Franco (por acinte, «mexias» posto que o «Xuão», para grande gáudio dos lisboetas, profusamente reproduzido no seu anedotário, falava «achim»).

Publicado por Fernando Fava